O tráfico de animais silvestres: o grande ciclo vicioso e suas consequências.

A relação entre homem e fauna, se dá, desde os primórdios. Onde o homem se utilizava da caça para alimentar-se. Porém, assim que o homem foi evoluindo e dominando novas técnicas de sobrevivência, ele também ampliou seu domínio e foi se “antropocentizando”.

Á medida que homem passa a achar-se que possui domínio sobre outras espécies, ele se vê no direito de intervir no meio ambiente e no ecossistema. A ideia de recursos inesgotáveis, que se perpetua até a atualidade, impacta tanto a fauna, quanto a flora causando um sério desequilíbrio ecológico.

No Brasil a exploração dos recursos naturais teve inicío com a chegada dos portugueses, no período de colonização. E foi através da primeira carta enviada a coroa portuguesa, escrita por Pero Vaz de Caminha, que se obteve o primeiro registro da riqueza, de fauna e flora, que existia no país. Digo existia, no passado! Já que na atualizade o cenário é bem diferente, a exemplo disso temos a Mata Atlântica que detém apenas 10% de sua cobertura original, visto que ela sofreu um intenso processo de desmatamento. Apesar disso, é válido destacar que mesmo estando evidenciado os malefícios ecológicos e econômicos do desmatamento, demais biomas existentes no Brasil continuam sendo intensamente explorados de forma desordenada. Mesmo depois de tantos anos de conhecimento sobre os impactos gerados pelo desmatamento e pela retirada desordenada de matéria prima do meio ambiente. Sinal de que o País não aprendeu nada com seus erros de colônia!

E os avanços da inconsciência humana, não param por aí! Pois, mesmo depois de nos livrarmos da posição de colônia de exploração, ainda “preservamos” um pensamento arrogante e incapaz de perceber o quão é importante a preservação do meio ambiente. Ao invés disso, procuramos crescimento econômico a qualquer custo.

E uma das evidências desse pensamento é o destaque que o Brasil conquistou, através de estatísticas, em um de seus crimes ambientais mais cruéis: a retirada de animais silvestres de seu habitat natural para o tráfico. Seja ele para para subsidiar o mercado de colecionadores, pesquisadores ou para a transformá-los em pets. Estima-se que no país de maior biodiversidade mundial, cerca de 38 MILHÕES de animais são traficados em um período de um ano. O que faz com que estejamos no pódio do ranking mundial, como o terceiro país onde mais se trafica animais silvestres.

 Essas vítimas são retiradas de seus ninhos, nicho ecológico ou da convivência familiar, muito jovens, alguns até filhotes ainda. Muitos desses animais vão morrer durante o transporte, sem nem chegar ao destino final. Pois, os traficantes não estão preocupados com o bem estar do animal, eles estão preocupados com o dinheiro que vão ganhar! É um esquema milionário. Movimenta muito dinheiro e mobiliza muita gente: populações locais, que fazem a retirada, abrupta, do indivíduo do meio ambiente; caminhoneiros, que fazem o transporte; vendedores intermediários, que fazem a venda para o consumidor final; e finalmente o consumidor, que adquire o animal.

E o problema só está começando, ele não para no consumidor final. Ele continua. Nem sempre os sobreviventes que chegam ao lar do “desinformado” que comprou o animal, irão receber um tratamento específico e adequado. A primeira barreira é a alimentação, a pessoa provavelmente não vai buscar na literatura cinetífica o que aquele animal come. Logo, dará o que tiver disponível no momento ou algo indicado pelo “sábio” Google. E nem sempre o “disponível” será o necessário e correto para o animal que foi retirado do seu habitat natural. O que potencialmente pode ocasionar no espécime, sérias deficiências nutricionais que certamente provocará a morte do indivíduo.

Outra barreira encontrada é a deficiência de imunidade contra zoonoses facilmente encontradas em animais domésticos (cães e gatos), que, também, podem levar o animal silvestre a óbito. Além disso, esse fluxo de doenças pode se dar de maneira contrária, onde o animal silvestre transmite essas zoonoses para animais domésticos ou humanos.

 Além de todos os problemas já citados, existe ainda a questão ecológica que o animal é exposto. Ele se torna frágil, uma vez que, ele passa a ser dependente dos cuidados de um ser humano. E essa dependência, esse erro de manejo será o seu maior impedimento de uma reintrodução no meio ambiente.

É de se concordar que um animal que passou pelo processo de domesticação, ele não está apto para viver na natureza. Pois em ambiente natural, ele se tornará uma presa fácil. E mesmo que tivesse apto, essa reintrodução nem sempre se dá de forma harmoniosa. Porque ela pode causar um desequilíbrio ecológico, já que, nem sempre animais recuperados do tráfico sabe-se exatamente a sua procedência. Dificultando assim, a sua reintrodução…

Porque não é simplesmente, recuperar o animal, reabilitá-lo e jogá-lo em qualquer mata. É preciso fazer um estudo, saber se ele não se tornará uma espécie invasora, se ele não irá levar consigo zoonoses que dizimarão espécies já sobreviventes no local, quais serão as possíveis modificações que ele irá fazer ao ser reintroduzido, etc. Muitas pessoas pensam que é só descartar o animal não mais desejado e soltam o animal em parques ou florestas, ocasionando o tão famoso desequilíbrio ecológico.

Por isso, geralmente, esses animais devem ir para centros de reabilitação, onde passarão por tratamentos específicos, passarão por uma triagem, para posteriormente fazer parte de zoológicos ou parques. Mas esses locais nem sempre conseguem absorver todos os indivíduos. E aí? Oque fazer? Alguns pesquisadores, biólogos e veterinários dizem que a melhor opção é a eutanásia. Mas e agora, como explicar para a sociedade civil que aquele animal, que passou por dificuldades, foi traficado, foi reabilitado, tem que morrer?

Torna-se uma questão muito complicada de se resolver. Portanto, animais silvestres, como já nos alerta a constituição: não devem ser perseguidos, capturados, comercializados, sem a licença do órgão ambiental responsável. As pessoas têm que entender e respeitar o meio ambiente. Desenvolvimento econômico? Claro! Desde que seja sustentável. Posso ter um animal silvestre em casa? Pode! Desde que o tenha comprado de um cativeiro legalizado e se tenha responsabilidade pela vida do animal.

O maior problema é que desde a colonização aos tempos atuais o homem quer ser dono da natureza, ter posse. Mas não somos donos. Somos meros colaboradores. Dependentes dos serviços ecológicos a nós prestados gratuitamente. E como colaboradores, devemos proteger e respeitar o meio ambiente. E com franqueza: animal silvestre não é pet! Pare de contribuir para o tráfico de animais.

Bibliografias:

FARIAS, Camila Garcia. Animais Silvestres em situação de domesticação: Uma análise das soluções dadas pelo judiciário Brasileiro e das alternativas oferecidas pela legislação. Monografia (Título de bacharel em Direito) – Universidade do Sul de Santa Catarina. Santa Catarina, 2011. Disponível em: <http://www.riuni.unisul.br/handle/12345/1096>. Acesso em: 06 fev. 2021.

FÉLIX, Catrine; DIAS, Marialice. A TUTELA JURÍDICA DOS ANIMAIS SILVESTRES MANTIDOS EM CATIVEIROS DOMÉSTICOS. Nova Hileia | Revista Eletrônica de Direito Ambiental da Amazônia. ISSN: 2525 – 4537, [S.l.], v. 1, n. 1, p. 92-106, maio 2017. ISSN 2525-4537. Disponível em: <http://periodicos.uea.edu.br/index.php/novahileia/article/view/418&gt;. Acesso em: 04 fev. 2021.

Lei n. 9.605/98 de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9605.htm >. Acesso em: 05 fev. 2021.

MAGALÃES, Janaína Silvestre. Tráfico de animais silvestre no Brasil. Monografia (Licenciatura de Ciências Biológicas) – Faculdade de Ciências da Saúde do Centro Universitário de Brasília. Brasília, 2002. Disponível em: <https://repositorio.uniceub.br/jspui/handle/123456789/2431>. Acesso: 08 fev.2021.

NASSARO, Adilson Luís Franco. Animais Silvestres e o Propósito de estimação. Monografia (Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais) – Faculdades Integradas de Guarulhos (FIG). São Paulo, 2001. Disponível em: <https://www.academia.edu/download/45624165/Animais_Silvestres_estimacao.pdf >. Acesso em: 04 fev.2021.

PETTER, Creusa Alves Bomfim. Tráfico de animais silvestres. 2012. viii, 32 f., il. Monografia (Licenciatura em Ciências Biológicas) —Consórcio Setentrional de Educação a Distância, Universidade de Brasília, Universidade Estadual de Goiás, Brasília, 2012.Disponível em :<https://bdm.unb.br/handle/10483/4353>. Acesso: 05 fev.2021.

2 comentários em “O tráfico de animais silvestres: o grande ciclo vicioso e suas consequências.

  1. O tráfico de animais é a extrema crueldade com os pássaros e demais animais silvestres, que nasceram livres e têm direito a viver dignamente. A eutanásia não é solução, porque é mais cruel ainda, uma verdadeira traição contra as pobres vítimas que deveriam ser resgatadas. Os centros de reabilitação precisam de recursos governamentais urgentemente, como o centro de Seropédica, no RJ. Além disso, precisamos conscientizar as pessoas a tratar os animais não humanos com dignidade, sem prender, traficar, maltratar e matar. Os pássaros, por exemplo, têm direito a voar livres, como ´é a natureza deles. É extrema crueldade as pessoas, para satisfazerem seus caprichos, quererem fazê-los enlouquecer, presos numa gaiola. Enquanto o ser humano continuar tratando os animais com crueldade ou os assassinando, não haverá paz na face da Terra.

    Curtido por 1 pessoa

    1. Infelizmente, zoológicos e os CETAS, não conseguem absorver a quantidade de espécies invasoras e/ou exóticas. E com o aumento das pessoas adquirindo pets não convencionais ( muitas vezes de outros países), a tendência é que haja um aumento de animais exóticos sendo “lançados” nos mais diversos habitats. O que faz com que espécies nativas sejam prejudicadas ( doenças, competição desleal) e até extintas. O melhor conselho é, não compactuar com o tráfico de animais comprando animais não legalizados.

      Curtir

Deixe um comentário